terça-feira, 3 de abril de 2018

Atlético Madrid. Segurança é palavra-chave para Simeone

Diego Costa e Griezmann têm mostrado bom entendimento

Depois de dois brindes (Astana e Viktoria Plzen), uma fava. O sorteio dos quartos de final da Liga Europa colocou no caminho do Sporting aquele que para muitos é o principal favorito à conquista da prova, o Atlético Madrid de Diego Simeone.

O histórico recente não deixa margem para dúvidas. Das oito equipas resistentes, os colchoneros são os únicos que na última década atingiram finais europeias, e logo por quatro vezes, entre as quais duas da Liga dos Campeões no último quadriénio (2013/14 e 2015/16). É, por isso, um conjunto habituado a estar por esta altura ainda a disputar a Champions.


Mas este Atleti é mais do que um grande nome do futebol europeu. Trata-se de um conjunto que ocupa a vice-liderança da bastante competitiva Liga Espanhola, à frente do vizinho Real Madrid e apenas atrás do Barcelona, e que nas rondas anteriores da Liga Europa não sentiu dificuldades para afastar Copenhaga e Lokomotiv Moscovo.


Seis anos e meio de Cholismo

Embora viva no país do tiki-taka, o futebol do Atlético Madrid é a antítese do estilo de jogo mais elaborado, floreado e assente na posse de bola que os clubes e as seleções de Espanha têm patenteado. Depois de muitos anos com um ataque de luxo em que pontificavam nomes como Diego Forlán, Kun Aguero, Simão Sabrosa, José Antonio Reyes mas uma defesa permeável e carente de qualidade, Diego Simeone assumiu o comando técnico em dezembro de 2011 e tornou os rojiblancos (muito) mais consistentes defensivamente e regulares.

De candidatos a acompanhar Barcelona e Real Madrid no apuramento para a Liga dos Campeões, os colchoneros intrometeram-se na luta bipartida do futebol espanhol e lograram mesmo o título nacional em 2013/14, com um futebol assente na segurança, no foco, no compromisso e no entender do jogo seguinte como o mais importante, bem à imagem do seu treinador. E uma vez que Simeone enquanto jogador era conhecido como El Cholo, a filosofia da equipa foi apelidada de Cholismo.

Para o técnico argentino, a segurança defensiva é a base do sucesso. Gosta de equilibrar a presença de jogadores mais virtuosos com outros menos talentosos mas mais assertivos nas suas ações e no seu posicionamento. No 4x4x2 habitual, geralmente só um dos extremos é puro: o outro ala é mais um terceiro médio. A presença de um lateral mais ofensivo de um lado é compensada pela de um mais posicional do outro. O exaustivo trabalho defensivo dos alas e a criação de superioridade numérica nos momentos defensivos são obrigatórios. O guarda-redes e os defesas têm ordem para aliviar a bola com pontapé para a frente à mínima pressão a que sejam sujeitos.
Simeone está no banco do Atlético desde dezembro de 2011

Assim se explicam os números de um coletivo pragmático, que teve a melhor defesa do campeonato espanhol em quatro das últimas cinco temporadas - 27 golos sofridos em 2016/17, 18 (!) em 2015/16, 26 em 2013/14 e 31 em 2012/13. Na época em curso, com 30 jornadas já decorridas, apenas foram encaixados 14 golos, o que lhe confere o estatuto de defesa mais batida da liga espanhola.

Embora a solidez defensiva seja o grande cartão-de-visita, a principal figura da equipa reside no ataque e dá pelo nome de Antoine Griezmann, o dono da bola dos colchoneros. Com 17 golos e oito assistências na Liga, o atacante francês faz um pouco de tudo no terço do campo e viu a sua liberdade de movimentos ser reforçada em janeiro com a entrada de Diego Costa. Inserido no estilo de jogo pouco elaborado e muitas vezes direto da defesa para o ataque sem passar pelos médios, a velocidade, qualidade técnica, perspicácia e arte do atacante gaulês são essenciais nas fases de criação, preparação e finalização.

Pese esta filosofia, o Atlético já desperdiçou vantagens de 1-0 por oito vezes esta temporada, contabilizando todas as competições. Por falar em contabilidade, outro problema têm sido os inúmeros problemas físicos: a imprensa espanhola conta 31 (!) ao longo da época.


Raio-X às opções

O dono da baliza colchonera é um velho conhecido do futebol português, Jan Oblak, que no currículo tem passagens por Beira-Mar, Olhanense, União de Leiria, Rio Ave e Benfica. Foi da Luz que saltou para o Vicente Calderón em 2014, por 16 milhões de euros. Quatro anos depois, é considerado um dos melhores guarda-redes do campeonato espanhol – a par de Ter Stegen, do Barcelona - e do mundo, pelos reflexos apuradíssimos, o bom posicionamento e a segurança entre os postes, características que têm valido pontos e marcas invejáveis de inviolabilidade e que rapidamente fizeram esquecer o antecessor, Thibaut Courtois. Ainda assim, não é seguro que o esloveno defronte o Sporting, uma vez que o guarda-redes argentino Axel Werner foi utilizado nos últimos dois jogos da Liga Europa e deu conta do recado.

Os centrais primam, acima de tudo, pelo asserto posicional e imponência do jogo aéreo, algo que também conseguem fazer valer na área adversária. A dupla uruguaia constituída por Diego Godín e José Giménez tem sido a mais utilizada nos últimos meses, mas Giménez sofreu um traumatismo no pé esquerdo ao serviço da sua seleção na recente data FIFA e poderá abrir espaço ao montenegrino Stefan Savic, que recuperou há poucas semanas de uma lesão muscular na coxa esquerda.
 
Onze inicial frente ao Villarreal (18 de março)
Nas laterais, é praticamente certo que Lucas Hernández seja o escolhido para o lado esquerdo no confronto com os leões, até porque o concorrente Filipe Luís fraturou o perónio esquerdo num lance com Éder na visita ao Lokomotiv. O recém-tornado internacional francês é algo limitado do ponto de vista técnico nem é especialmente acutilante no capítulo ofensivo, mas oferece a tal consistência defensiva que Simeone tanto aprecia.

No lado direito, a incerteza é maior, até porque ambos os candidatos ao lugar têm apresentado problemas musculares. Juanfran é já um histórico do clube e que sabe tudo acerca do trabalho de um lateral, que faz com segurança e assertividade. Contudo, os 33 anos e a concorrência de um Vrsaljko mais dotado ofensivamente retiraram-lhe o estatuto de titular indiscutível. Aliás, o croata até tem sido mais vezes opção. Face a estes problemas, Simeone viu-se obrigado a estrear o canterano Carlos Isaac no jogo de domingo diante do Deportivo.

Subindo até à zona central do meio-campo, encontramos três galos para dois poleiros. O canterano Saúl Ñíguez é, de longe, o mais utilizado, o mais completo, o que tem mais qualidade de passe e o que mais se liberta para o ataque a partir desse duplo pivot. Depois, a dúvida é entre dois outros homens da cantera: o mais jovem e virtuoso Thomas Partey, que oferece mais qualidade à saída de bola e tem algumas semelhanças com William Carvalho; e o mais trabalhador e experiente Gabi, capitão de equipa e jogador à imagem de Simeone, algo limitado tecnicamente mas imprescindível para condicionar a construção de jogo do adversário – se jogar, deverá ser o polícia de William Carvalho.

Numa das alas, mas com ações mais típicas de médio do que propriamente de extremo, Koke é outro dos intocáveis para o treinador argentino. Principal organizador de jogo dos colchoneros, aparece muito em zonas interiores – perto do duplo pivot – e faz notar a sua capacidade técnica, visão e qualidade de passe.

No outro corredor (que tanto pode ser o direito ou o esquerdo), aí sim, um extremo puro. O mais utilizado tem sido Ángel Correa, que não é propriamente um fantasista mas que consegue fazer mossa pela forma como penetra na área contrária, preferencialmente a partir da direita, e que define bem na zona de decisão, um pouco a fazer lembrar o benfiquista Salvio. Menos afortunado, até porque chegou em janeiro depois de ter estado emprestado ao Las Palmas na primeira metade da época, Vitolo é um pouco mais dado à criação de desequilíbrios através do drible e tem a particularidade de ter vencido a Liga Europa por três vezes ao serviço do Sevilha.

Griezmann já leva mais de 100 golos pelo clube
No ataque, a menos que Simeone decida poupar esforços a pensar no dérbi de dia 8 com o Real Madrid, há lugar cativo para Antoine Griezmann. Depois de um começo de época intermitente, o francês retomou a boa forma, reforçou a liberdade posicional nos últimos 30 metros após a chegada de Diego Costa e vai acumulando golos, assistências e jogadas daquelas que, para Jorge Jesus, são de… nota artística.

Mais fixo no ataque, mas sem deixar de aparece nos corredores laterais para oferecer soluções aos companheiros e arrastar marcações, Diego Costa empresta à equipa a sua combatividade e o seu futebol muito físico, próprio de quem tenta ganhar os lances em velocidade, a resistir às cargas ou nas alturas. Ainda assim, o hispano-brasileiro apenas leva 75 minutos em 360 possíveis na Liga Europa, uma vez que Simeone tem aproveitado a competição para dar mais ritmo ao experiente Fernando Torres e ao oportunista Kévin Gameiro.


A filial do Athletic Bilbao que superou o progenitor

O clube foi fundado a 26 de abril de 1903 com o nome Athletic Club de Madrid, por três estudantes bascos adeptos do Athletic Bilbao a viver na capital espanhola. A título de curiosidade, foi precisamente quando completou 18 anos, em 1921, que o emblema de Madrid se tornou independente do clube-pai.

Mais tarde, em 1939, fundiu-se com o Aviación Nacional of Zaragoza para se tornar Athletic Aviación de Madrid. Dois anos depois, devido a uma lei imposta pelo ditador Francisco Franco que proibia equipas de utilizar nomes estrangeiros, o nome foi alterado para Atlético Aviación de Madrid. Durou até 1947, quando o clube decidiu libertar-se de qualquer relação às forças armadas e mudar nome para Club Atlético de Madrid, que ainda se mantém.

Paralelamente, durante o período da Guerra Civil, a maioria dos colchões de lã comercializados em Espanha eram fabricados pela mesma empresa, que tinha um desenho precisamente igual à camisola do Atleti: listas verticais vermelhas e brancas. Aí nasceu a alcunha de colchoneros.

Curiosamente, as primeiras cores do emblema de Madrid até eram o azul e o branco, à semelhança do Athletic Bilbao na altura. Os equipamentos utilizados eram dos ingleses do Blackburn Rovers, mas numa viagem a Inglaterra em 1911 para renovar o stock para ambos os clubes, o dirigente e jogador não encontrou equipamentos do Blackburn, acabando por comprar camisolas vermelhas e brancas do Southampton.
O moderno Wanda Metropolitano é a nova casa do Atleti

No plano desportivo, desde a década de 1940 que o Atlético tem sido a equipa que mais vezes se tem intrometido na luta crónica entre Real Madrid e Barcelona. Prova disso são os 10 títulos de campeão (em 81 presenças na I Liga), as dez Taças do Rei e as duas Supertaças. A nível internacional, foi finalista vencido da Taça/Liga dos Campeões em 1973/74, 2013/14 e 2015/16, venceu a Taça das Taças em 1961/62 (e foi finalista em 1962/63 e 1985/86), a Liga Europa em 2009/10 e 2011/12, a Supertaça Europeia em 2010 e 2012 e a Taça Intercontinental em 1974.

Em mais de 40 temporadas a disputar nas competições europeias, os rojiblancos já defrontaram clubes portugueses por 20 vezes: ganharam nove, empataram cinco e perderam seis. Com o Sporting, cruzaram-se nos oitavos de final da Liga Europa em 2009/10, tendo passado à ronda seguinte após empate a zero no Vicente Calderón e uma igualdade a duas bolas em Alvalade.

Contudo, os leões terão já na quinta-feira o prazer de se tornarem a primeira equipa lusa a competir no novo estádio do Atlético, o Wanda Metropolitano, transferido para a posse do clube em 2013 e reinaugurado em setembro do ano passado – em 23 encontros no novo palco, os colchoneros apenas não marcaram num jogo e ainda não foram derrotados para o campeonato. Um recinto moderno, com capacidade para 67.703 espetadores, tem apresentado excelentes molduras humanas, ambientes agradáveis e não só vai receber a final da Liga dos Campeões na próxima temporada como deverá ser palco permanente do jogo decisivo da Taça do Rei.

Por falar em infraestruturas, está construção a Cidade Desportiva do Atlético, em Alcalá de Henares, a cerca de 25 quilómetros do estádio.






1 comentário:

  1. Finalmente consegui perceber a alcunha de colchoneros. Gostei da explicação detalhada de como funciona esta falange de guerra do Simeone. O Sporting não vai ter tarefa nada fácil.

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